Este em seu braço esquerdo, sendo ainda maior do que o anterior. Era redondo e tinha em sua circunferência o diâmetro de uma laranja. Mostrou e enfatizou: “Foi o maldito pernilongo quem fez isso.” Mostrou outros hematomas menores espalhados por seus braços brancos, frágeis e delgados. Atribuiu todos ao pernilongo. Aquele hematoma no braço esquerdo impressionava não só por sua forma exata, bem delineada, mas por seu relevo. Tratava-se de um hematoma em alto relevo, na cor vinho, e parecia poder romper e extravasar a qualquer momento. Segundo Bob/Rock/Blues, aquele seria o pai de todos os hematomas.
A cuidadora, com certa pressa, como se fosse responsável por manter a mínima coerência no recinto, entrou pelo quarto com um copo de água para o homem e disse que aquilo fora o resultado de um tombo que ele levara no final de semana quando passava o dia na casa da filha, em Ribeirão Preto. Bob/Rock/Blues não gostou nada da intervenção da mulher. Olhava-a com certo desprezo e total reprovação, como se a mulher não dissesse nada com nada, como se ela fosse uma tola estouvada. Então ele aguardou que ela se afastasse. Sentado na borda da cama, esticou o pescoço para certificar-se de que ela ia longe pela porta que dava do quarto para a sala e continuou examinando o pai de todos os hematomas, impressionado com a obra maior do pernilongo, seu algoz.
“Eu não sei onde Deus estava com a cabeça!” “Como?... Quem?!” “Deus, ora! Não sei onde ele estava com a cabeça quando inventou o pernilongo.” “Seu Bob/Rock/Blues, quer dizer que agora o senhor entrou para a oposição?” Ele não respondeu nem que sim nem que não, tampouco sorriu. Continuou passando a mão e examinando sua coleção de hematomas. “Maldito pernilongo! E a gente não consegue matar ele nunca. Quando a gente vai pra matar, o bicho foge. E pra matar um bicho desses, só se for na bala. Ele é muito esperto.” “O senhor já experimentou colocar um repelente aqui?” “Ih, já tentei de tudo que você pensar, o bicho parece até gostar dessas coisas químicas, aí é que ele fica doidão e pica a gente pra valer.” De repente Bob/Rock/Blues arregalou os olhos em direção à janela de seu quarto. “Shiiiiu. Não olhe agora. Ele pousou na janela, no parapeito. Finja que vai pegar alguma coisa e veja..., mas não olhe direto pra ele..., pode espantá-lo” Sussurrou como se coordenasse uma delicada manobra de guerra.
Conforme Bob/Rock/Blues ordenou, fiz. Sob pretexto de apanhar a bisnaga de gel para hematomas sobre o criado mudo, voltei-me discretamente de perfil para a janela cuja qual eu estava de costas até então. Foi quando vi a silhueta do bicho que estava pousado sobre o parapeito. Da extremidade de seu probóscide, a ferramenta perfurante usada para sugar o sangue da vítima, no caso, algo semelhante a uma grande tromba, à extremidade de seu abdome, o bicho tinha o tamanho de uma águia, um carcará, cerca de cinqüenta centímetros de comprimento. Com suas pernas longas então, era bem maior que um carcará. Ele parecia olhar fixamente Bob/Rock/Blues com a finalidade de inibi-lo. Por algum tempo, fiquei imóvel com a bisnaga de gel em uma mão e com o olhar abestalhado em direção a caixa do medicamento que estava na outra, como se lesse as inscrições da embalagem. Bob/Rock/Blues olhava fixamente para o inseto, tinha ódio no olhar. Em contrapartida, o olhar do inseto certamente seria indiferente, desprovido de qualquer afetação ou emoção. Ele apenas aguardava o momento que lhe parecesse adequado para mais uma refeição.
Rafaela Soares com Jefh Cardoso
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